Argentina desmantela trabalho escravo na agricultura
Uma multinacional do comércio de grãos, Nidera, que está presente em 22 países e tem sua sede na Holanda, foi denunciada no final do ano passado por um fiscal argentino e pelo Ministério do Trabalho de Buenos Aires por suposto trabalho escravo em uma de suas filias.
A companhia, que também produz sementes, fertilizantes, herbicidas e fungicidas, negou a acusação, mas as condições desumanas em determinadas atividades agrícolas em pleno século XXI e em um dos setores mais produtivos da Argentina despertaram um debate tal que obrigou a realização de uma reunião na última quarta-feira entre o ministro do Trabalho argentino, Carlos Tomada, e os quatro principais coletivos de agricultores e criadores de gado do país. Tomada anunciou a criação de um espaço de ação conjunta para "erradicar o trabalho ilegal e as condições de servidão que a justiça está investigando".
Mas as condições de escravidão na Argentina não foram detectadas só no campo, mas também em ateliês têxteis de Buenos Aires, em prostíbulos de todo o país e até em fábricas de tijolos dos subúrbios da capital ou da cidade de Neuquén, na Patagônia, tal como vem denunciando a cooperativa La Alameda, em que são empregados trabalhadores libertos dessa submissão. Cerca de 1,3 milhão de latino-americanos padecem do trabalho forçado, segundo a Organização Internacional do Trabalho - OIT.
O fiscal Rubén Giagnorio denunciou sete empregados da Nidera por suposta "redução à servidão" (o que, em termos legais na Argentina, equivale ao trabalho escravo) de 60 menores e 120 adultos, temporários da província nortenha de Santiago del Estero, transferidos para o município de San Pedro (165 quilômetros ao norte de Buenos Aires).
O fiscal e os máximos funcionários do ministério denunciaram que a Nidera os havia levado por 15 dias, sem saber quanto iam cobrar, e que os havia encerrado em uma propriedade, não os deixava sair e retinha os seus documentos de identidade. Segundo os denunciantes, dormiam amontoados em barracas como as de um campo de concentração, careciam de banhos, água potável, extintores e materiais para a segurança laboral, as instalações elétricas eram deficientes e sofriam descontos em seus salário para pagar a indumentária de trabalho e a comida, que um provedor externo lhes vendia a um preço maior do que nos comércios. Inclusive, fez-lhes pagar por pacotes de espaguete que levavam o logotipo do Ministério do Desenvolvimento Social de Buenos Aires e que são distribuídos gratuitamente. Além disso, as crianças manipulavam produtos químicos sem nenhuma precaução, segundo o governo bonaerense.
A Nidera, que na Argentina é a sexta exportadora de grãos e a número um em produção de sementes de soja e de girassol, respondeu em um comunicado de imprensa que todos os trabalhadores estavam registrados na Seguridade Social, que as condições de salário, transporte, trabalho, alojamento, higiene e alimentação administradas haviam sido as estipuladas por lei e que nenhum desses "serviços" havia sido descontado da remuneração.
A empresa também assegurou que os menores de idade tinham entre 16 e 18 anos e podiam trabalhar porque estavam autorizados ou acompanhados por seus pais. "A acusação se refere a uma prática industrial comum, em que as empresas de sementes contratam empregados temporários para desflorar plantas de milho híbrido", defendeu-se a Nidera, uma empresa de uma família holandesa-argentina que está presente em países como Brasil, Uruguai e do Leste Europeu.
Nos últimos dias, ocorreram outras seis invasões de propriedades nas quais os ministérios do Trabalho bonaerense e federal descobriram que duas companhias de capitais argentinos submetiam à "servidão" outros 586 adultos e seis menores de idade. A questão ganhou tamanha dimensão que a presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, decidiu incluí-la na agenda da reunião que os coletivos agrícolas iam ter na quarta-feira com o ministro da Agricultura para discutir sobre a liberalização mercado do trigo.
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