Relatório mostra que menos de 1% das  multas aplicadas pelo Ibama são pagas – Documento do próprio órgão  indica que apenas 0,75% das autuações foram pagas entre 2005 e 2010; nº  de multas e valor em reais vêm caindo ano a ano; Ibama culpa demora de  processo administrativo de apuração e uso de ‘laranjas’, que inviabiliza  cobrança
Menos de 1% do valor das multas  aplicadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos  Naturais Renováveis (Ibama) por infrações ambientais chegam efetivamente  aos cofres públicos, aponta relatório do próprio órgão obtido pelo  Estado. O documento traz um panorama das autuações feitas entre 2005 e  2010. O porcentual médio de multas pagas no período foi de 0,75%. No ano  passado, o índice foi ainda menor – apenas 0,2%. Reportagem de Andrea  Vialli, em O Estado de S.Paulo.
Os dados mostram ainda que o número de  multas aplicadas caiu 42% no período – de 32.577 multas em 2005 para  18.686 em 2010, bem como os valores relacionados a essas multas. A maior  parte das autuações está associada a crimes contra a flora, o que  inclui desmatamentos, queimadas e venda de madeira ilegal.
Há ainda Estados com autuações  bilionárias. É o caso do Pará, que desde 2005 encabeça a lista de  recordistas em multas por infrações ambientais. Só em 2010, o valor das  autuações soma R$ 1,02 bilhão. Mato Grosso vem em segundo lugar, com R$  376,5 milhões em 2010.
O baixo porcentual de multas  efetivamente pagas reflete, segundo o próprio Ibama e especialistas, a  complexa tramitação dos processos de apuração de infrações ambientais.  “O processo administrativo de apuração de infração ambiental não tem o  poder de, per si, garantir o pagamento de multa”, explicou o Ibama em  nota ao Estado.
A legislação atual prevê a inscrição de  devedores no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor  Público Federal (Cadin) e a inscrição de débitos na Dívida Ativa da  União, em procedimento de execução fiscal exercido pela Advocacia-Geral  da União. Para chegar a tanto, o processo passa por duas instâncias de  julgamento. Antes de 2009 – quando deixou de existir a possibilidade de  recurso final ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) – os  processos chegavam a voltar até oito vezes ao órgão ambiental.
Por outro lado, segundo o Ibama, os  processos de autos de infração referentes aos crimes de desmatamento são  de tramitação mais complexa, pois envolvem altos valores de multas e  frequentemente são contestados na Justiça. “Esses processos refletem  também a ordenação fundiária da Amazônia Legal, com implicações na  confirmação de autoria da infração ambiental”, afirma a autarquia.
“A quantidade e os valores das multas  são proporcionais às regiões onde ocorrem mais desmatamentos e onde as  fiscalizações têm sido mais intensas”, avalia Brenda Brito, pesquisadora  do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). A entidade  realiza estudos desde 2004 na Amazônia que confirmam o baixo pagamento  das multas ambientais. “Na melhor das hipóteses, a arrecadação das  multas chega a 3%”, diz.
Laranjas. Além dos aspectos  burocráticos, o alto índice de multas não pagas é fruto também da  informalidade em que operam muitas empresas, especialmente na Amazônia  Legal. “Em Estados como o Pará, é comum empresas serem abertas por  “laranjas”. Uma vez multadas, essas pessoas jurídicas não possuem bens  nem recursos, então a multa nunca chega a ser paga”, explica Ubiratan  Cazetta, procurador do Ministério Público Federal (MPF) no Pará. “Essas  empresas de fachada são propositalmente criadas para serem carregadas de  multas.”
A queda no número de multas ambientais  de 42% entre 2005 e 2010 não aponta, necessariamente, para a diminuição  real das infrações ambientais no País. Segundo o Ibama, “houve uma  mudança de estratégia, que trouxe redução do número de autos de  infração, porém resultou em multas mais elevadas”, afirma a nota. “O  Ibama deixou a rotina de fiscalizar cada localidade para concentrar  energia no combate a grandes desmatadores e a ilícitos ambientais de  maior abrangência identificados por meio do cruzamento de imagens de  satélite com informações sobre as frentes de desmatamento na Amazônia e  demais biomas.”
Para Brenda Brito, do Imazon, a  diminuição da quantidade de multas não é ruim. “O foco nos grandes  infratores dá resultado, assim como a apreensão de materiais, como  madeira ilegal”, diz. No entanto, ela avalia que não basta multar.  “Emitir multa é importante, mas não deve ser a principal estratégia de  combate aos crimes ambientais”, avalia a pesquisadora. “É preciso  investir mais em prevenção do desmatamento e em medidas como embargo das  áreas onde ocorreram as infrações e sanções de crédito aos  desmatadores”, aponta.
Vigilância. Outra saída para a redução  dos crimes ambientais é a vigilância do mercado, na avaliação do  procurador do MPF no Pará. Foi o que aconteceu com a cadeia da pecuária  no Pará, em 2009. Após a atividade ser apontada como o principal vetor  de desmatamento na Amazônia, supermercados, frigoríficos e pecuaristas  firmaram um Termo de Ajuste de Conduta (TAC). Os frigoríficos se  comprometeram a só comprar gado de pecuaristas com a situação fundiária  regularizada, inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR).
O resultado foi uma explosão no número  de propriedades rurais cadastradas, que é o primeiro passo para a  regularização ambiental das terras. Em 2007, apenas dez propriedades do  Pará estavam inscritas no CAR. Hoje, são 52 mil. “A combinação de ações  mais efetivas de fiscalização com um esforço para regularizar o setor  produtivo é o caminho mais eficiente para a redução de crimes como o  desmatamento”, resume Cazetta.

Nenhum comentário:
Postar um comentário