7 de mai. de 2011

Escuta aqui, ô

 

por Marli Gonçalves (*)

Vamos tentar falar calma e mansamente. Mas se nos exaltarmos, pedimos desculpas de antemão. Vamos enumerar uns fatos dos últimos dias, em busca de algum ouvido que não seja mouco, e que entenda quão feia está a coisa, o quanto estamos chateados em sermos feitos de cordeiros calados, vistos como uma plateia cativa e silenciosa. Cadê o gerente da Taberna Brasil?
Vamos tomar satisfação, como se dizia antigamente, lembra? Pais sempre iam tomar satisfação quando seus filhos sofriam alguma coisa. Lembro de minha mãe subindo nas tamancas por mim, e de uma vez que ela enfrentou a mãe de uma amiga, que era uma bruxa da sociedade assim tipo Marta. A filha, coitadinha, penava, e a riqueza era o problema. Soube mais tarde que a herdeira destituiu a própria mãe quando alcançou 18 anos e como prometera que faria no tal dia da encrenca.
Estamos mais ou menos assim: enchendo o baldinho até o dia que ele vai transbordar. Um perigo. Quando isso acontecer vai sobrar para tudo quanto é lado, mas seria bom se conseguíssemos nos fazer ouvir antes disso. Seria bom para todo mundo. E não me venham falando em luta de classes, brigas partidárias, tucanos e estrelinhas, nem tentem desmerecer quem aponta. Não é porque é petista que tem de ser chucro; não é porque é tucano que tem que ficar em cima do muro. Não é porque é militar que pode tudo. É preciso apenas ser contemporâneo, suprapartidário, cidadão, ecumênico, patriota, ter amor à vida, querer um futuro mais desenvolvido e respeitável, um mundo melhor. Somos nós essa massa a clamar: CHEGA!
Sabe? Me diga se não estamos com muita vontade de pegar uns caras pelo colarinho e chacoalhar? Chacoalhar muito? Escuta aqui, está pensando que somos o quê? O tal Roberto Requião, por exemplo, que envergonha hoje a palavra senador tanto quanto envergonhou outras vezes a palavra governador, político, paranaense. Apodera-se do gravador de um repórter, ameaça bater nele, e ainda sai se vangloriando por isso. Apaga a fita e ainda canta de galo? Roubo e violação = crime. Censura=crime. Ameaça física=crime. E ele ainda ousou dizer na tribuna, que deveria ser sagrada, que "era provocação" (o garoto perguntava das aposentadorias que ele põe no bolso quando o monstro atacou), que está sendo vítima de bullying por parte da imprensa?
Deus que me perdoe - que há anos tive um confronto com ele e sei do que é capaz - mas fico pensando se um cara desses ousasse tocar em algo meu. Caneta, gravador, celular, fone de ouvido, fivela de cabelo ou um grampo enferrujado. As minhas unhas virariam garras de adamantium imediatamente. Ele ia ter que me sacudir do seu pescoço, como se eu fosse um colar de pérolas, tão grudada que eu ia estar nesses ossos. Isso na melhor das hipóteses, de eu me defender começando por cima.
Aí - veja bem que tudo isso nesses últimos dias - o outro, o de bigodes, com seus marimbondos de fogo encarapitados em todos os escalões, vem e diz que não deve ter sido nada, que esse sujeito truculento é um "cavalheiro". Para acabar de cuspir em nossa cara indica um amigo cheio de defeitos para presidir a tal Comissão de Ética. E essa ainda terá entre um de seus membros aquele cavalheiro tão inocente, aquele anjo de candura, tão puro, de ações tão delicadas quando elefantes pisando na relva, Renan Calheiros.
Essas marcas marrons estão no tapete azul do Senado; não dá para passar e não pisar. Do outro lado, onde os tapetes são verdes, entre outros exemplos, há também marcas de sangue, do ódio e do preconceito que tem levado a vida de tantos de nós. Uma "bancada da bala" orgulhosa das relações com os fabricantes de armas. E ali vive também uma antiga erva daninha, o troglodita Jair Bolsonaro. Pensam que ele parou? Andou falando agora que sofre de preconceito heterossexual. Pode? Depois o chamam de enrustido e ele baba. Racismo=crime. Homofobia=crime. Não sei como ele não fez como o outro que mandou a gente se lixar!
E são eleitos e reeleitos, e não há informações e uma investigação clara de exatamente por que o conseguem, como, que métodos, que persuasão, que grupo representam, quem os financia e a quem interessam suas existências vis em locais-chave. Vem ano, sai ano e todos continuam lá. Fichas (es) corridas. E vamos levando até que aconteça algo mais grave, e aí a gente ficará se lamentando, escrevendo históricos, análises, críticas e manchetes.
Tudo tem limite. Fossem só estes os nossos problemas, acho até que poderia ficar chato. Mas, não. As companhias telefônicas, de energia, planos de saúde, seguros e outras nos tratam como escravos, de forma degradante, mantendo-nos amarrados aos pés das suas ricas mesas. Se ficar o bicho come; se correr, o bicho pega. Mas não há nem para onde. O tilintar das moedas só toca com as nossas sendo despendidas, na gasolina que não ia aumentar, nos preços que espicham sem controle, nas promessas que não vão ser cumpridas é nunca.
É a Taberna Brasil na melhor forma. O esculacho total. A ponto de lembrar um filme de Robert Rodriguez e Quentin Tarantino às vezes, mas sem os gerentes que jogam porta afora pelos fundilhos os que exageram. Na verdade, recordei de uma cena antológica de Um drink no Inferno, onde o porteiro anuncia que ali havia mulheres de todo o tipo, enumerando-as durante minutos pela vagina, suas cores, formas, nomes.
Na Taberna Brasil, sem direção alguma, o porteiro gritaria um sem-número de verdades para nos definir, dizer como estamos nos comportando dentro desse boteco, assistindo paralisados aos shows no palquinho.
E garanto, nenhum desses nomes seria bom ou divertido como os do filme.


(*) Marli Gonçalves é jornalista.

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